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24/3/2011

Lições da lista dos 100 químicos com trabalhos de maior impacto


           O ano de 2011 foi declarado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e a União Internacional de Química Pura e Aplicada (IUPAC) como o Ano Internacional da Química. No âmbito destas celebrações a Thomson Reuters publicou no ultimo dia 10 fevereiro uma lista mundial dos 100 Químicos que nos últimos 10 anos atingiram os escores mais altos de impacto de citação de trabalhos científicos na área da química (artigos e revisões).

           Uma vez que cerca de um milhão de químicos foram registrados nas publicações de periódicos indexados pela Thomson Reuters durante a última década, esses 100 representam a centésima parte superior de um por cento. Esta lista inclui um único ibero-americano que atua no Brasil e nenhum nome de Países emergentes como Rússia, China, Índia, etc., e muito poucos latinos (2 franceses e um italiano). Claro que podemos celebrar a presença de um brasileiro atuando no Brasil nesta lista. Mas o mais sensato é entender por que razões a imensa maioria se concentra em 3 Países - 70 atuam em instituições dos EUA e 7 na Alemanha e 4 na Grã-Bretanha. Pois bem, quais são as características destas instituições em que se concentram mais 80% destes químicos: são instituições de grande tradição no ensino de, pela e através a pesquisa. Todas se dedicam preferencialmente ao ensino de pós-graduação e possuem muito mais estudantes de pós-graduação do que graduação, isto é, são as responsáveis nos seus Países a fornecerem os mestres e doutores. São em geral especializadas isto é não atuam em todos os domínios da ciência. O numero de pedagogos é muito pequeno e em boa parte destas instituições inexistente. Os dirigentes são escolhidos segundo capacitação e mérito e não por eleições “municipais”. Atuam em geral em estreita cooperação com os setores não-acadêmicos apesar de se dedicarem preferencialmente a geração de conhecimento básico. Os pesquisadores nestas instituições trabalham em condições de confiança e liberdade com financiamento continuo e com avaliação e controle dos resultados. O arsenal legal ao qual estão submetidas estas instituições está desenhado para atender as necessidades do desenvolvimento da ciência, tecnologia e inovação que necessita de rapidez, agilidade e facilidade para acessar a equipamentos, materiais e dados assim como de sigilo. Estas características passam muito longe das instituições brasileiras e de suas práticas.

           Entretanto, o Brasil está num momento singular e que outros Países já passaram recentemente e não aproveitaram. O País necessita de gente qualificada em todos os níveis e para fazer ciência, de técnicos, engenheiros e claro de doutores. A evolução da ciência, tecnologia e inovação no Brasil é resultado direto e incontestável da pós-graduação (PG) e atuação das duas agencias publicas exemplares que executam as políticas públicas de C&T&I: CNPq e CAPES. Certamente, se não mudarmos o marco legal para administrar a ciência e se as Universidades Federais com PG de excelência não assumirem suas responsabilidades perderemos esta oportunidade histórica. As condições estão ai para que o circulo virtuoso do avanço da economia com o avanço da ciência, tecnologia e inovação se estabeleça e se consolide. Vale lembrar que enquanto nos países desenvolvidos existe uma grave crise de vocação para as ciências exatas e engenharias, no Brasil ainda temos um exército de potenciais cientistas. Temos de criar um modelo de recrutamento de jovens talentos para a ciência, a exemplo do que já fizemos exemplarmente no futebol e voleibol. Certamente temos atraído grande interesse de vários cientistas de outros países que cogitam trabalhar no Brasil. Entretanto, o sistema legal atual ao qual estão submetidas as instituições que desenvolvem ciência e tecnologia são incompatíveis com as necessidades de fazer ciência. Quando comentamos a colegas norte-americanos ou europeus que contratamos professores-pesquisadores por concurso público com exame escrito e didático eles em geral dão gargalhadas. Penso sempre, diga isto aos órgãos de controle brasileiros... já quiseram impor concurso público até para agente secreto! Aulas de PG em inglês são ainda uma raridade no País e ainda assim com a resistência de vários “colegas”, como podemos nos internacionalizar atraindo pesquisadores de outros Países, desta forma?

           Estamos num momento singular de nossa história científica e tecnológica e poderemos brevemente passarmos de expectadores a atores de base tecnológica de competitividade global. Entretanto, isto somente ocorrerá com a continuidade nos investimentos públicos que vem sendo feitos nos últimos oito anos e principalmente se houver uma profunda mudança jurídica que forneça as ferramentas legais adequadas para se administrar e desenvolver ciência. Não há nada de excepcional em fazer isto, temos exemplos de sucesso no mundo inteiro. Basta vontade política. Não se pode fazer ciência, tecnologia e inovação competitivos globalmente tendo como marco legal o mesmo de entrada do pré-sal, por exemplo. Ora, temos e criar e aumentar as vagas na graduação assim como de tecnólogos ou novos campi. Se não forem estas instituições com PG de excelência a assumir esta responsabilidade, quem o fará? Esta preferência se reflete nos investimentos institucionais que raramente são destinados diretamente a infra-estrutura de pesquisa/PG assim como na política de contratações tanto de novos docentes como de servidores técnicos administrativos onde a PG, em geral, é sequer consultada. Mas vale lembrar que apesar de tudo estamos num momento importante de transição: em quantidade de artigos estamos muito bem, mas em qualidade e aplicabilidade ainda deixamos a desejar, mas estamos indo na boa direção. Já somos olhados de outra forma lá fora, como sérios competidores de um mundo econômico cada vez, mas científico e tecnológico.


Fonte: Jairton Dupont (UFRGS)





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