Agência FAPESP – Em 1952, quando se passou a discutir mais o uso de energia nuclear para fins pacÃficos, foram apontadas cerca de 110 potenciais tecnologias para produzir energia a partir do átomo.
Três anos depois, em 1955, apenas uma dúzia delas foi considerada promissora e somente três tornaram-se viáveis industrialmente: as que utilizam reatores de água leve e pesada e a baseada em soluções gás-grafite.
Especialistas na área de “QuÃmica Verde” – como é definida a criação de produtos e processos quÃmicos ambientalmente sustentáveis – estimam que o mesmo processo de “seleção natural” deve acontecer no campo das iniciativas relacionadas ao desenvolvimento de biocombustÃveis e materiais renováveis baseadas em rotas tecnológicas inovadoras.
“Muitos projetos existentes hoje morrerão antes de serem produzidos em escala comercial. Só alguns sobreviverão por ter o privilégio cientÃfico e tecnológico ou a sorte histórica de alcançar o mercado investidor”, disse João Furtado, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) e diretor da empresa Elabora Consultoria, à  Agência FAPESP.
A fim de auxiliar os tomadores de decisão de investimento a identificar os projetos mais promissores na área, a empresa de consultoria preparou um compêndio, reunindo 250 iniciativas que estão sendo desenvolvidas em diferentes paÃses.
Intitulada World directory of advanced renewable fuels and chemicals, a publicação, que contou com apoio da FAPESP, foi lançada na segunda-feira (20/10) durante o 2nd Brazilian BioEnergy Science and Technology Conference (BBEST), que ocorre até sexta-feira (24/10) em Campos do Jordão (SP).
“O objetivo da publicação é oferecer um panorama abrangente das principais iniciativas hoje no mundo, para reduzir o grau de incerteza dos agentes tomadores de decisão nos campos cientÃfico, tecnológico, industrial e comercial”, afirmou Furtado. “A falta de informação de qualidade aumenta o grau de incerteza e, consequentemente, eleva os riscos presumidos e adia a tomada de decisões.”
De acordo com o professor, os 250 projetos listados na publicação foram anunciados até 2012 e têm origem tanto em grandes empresas como em start-ups, universidades, spin-offs (empresas surgidas em universidades) e instituições de pesquisa.
Alguns deles são iniciativas individuais, mas outros contam com uma complexa rede de parcerias formada por empresas de diversos setores, como de biotecnologia, energia e bens de consumo, por exemplo.
“As iniciativas nessa área se deparam com incerteza na trajetória tecnológica e podem resultar no desenvolvimento tanto de um novo material, como de um biocombustÃvel ou um insumo para um bem de consumo”, disse Furtado. “Para isso, precisam reunir apoio de parceiros de diferentes setores, como das indústrias de energia e bens de consumo, por exemplo”, afirmou.
De acordo com o professor, os principais critérios para a seleção dos projetos foram: ser baseado em inovação radical – que pode resultar em um produto novo – e ter uma alta probabilidade de atrair investidores.
“Muitos projetos listados já contam com parcerias com empresas de petróleo, energia e automobilÃstica”, disse.
Seleção dos projetos
Os projetos selecionados foram identificados a partir de fontes públicas, como a internet.
Uma equipe técnica da empresa, formada por engenheiros quÃmicos e profissionais de outras áreas, recolheu e analisou durante dois anos as informações para identificar os mais promissores em termos de esforços cientÃficos e tecnológicos.
As informações foram validadas pelos autores da publicação por meio de pesquisas realizadas com lÃderes dos projetos.
“Conseguimos reunir informações muito especÃficas de cada um dos projetos relacionados, como a capacidade da planta, total do investimento, patentes e a descrição da rota tecnológica utilizada, o principal ponto de focalização dos esforços cientÃficos”, disse Guilherme de Oliveira Marques, sócio da Elabora Consultoria e coordenador da equipe técnica do projeto.
Projetos de 38 paÃses foram incluÃdos na publicação. Os Estados Unidos, com 94 projetos, são o paÃs com o maior número de iniciativas relacionadas ao desenvolvimento de tecnologias de próxima geração em combustÃveis avançados realizados em seu território.
Os outros são Brasil (33), Alemanha (14), Holanda (12), Reino Unido (7) e Canadá (7).
A liderança dos Estados Unidos na área está relacionada ao grande número e à diversidade de polÃticas adotadas nos últimos anos para fomentar o avanço da bioenergia no paÃs por meio do financiamento de projetos voltados ao desenvolvimento de novas fontes de energia.
O paÃs norte-americano vem colocando ênfase no financiamento de projetos voltados a encontrar novas rotas de produção de biocombustÃvel, como etanol biodiesel e butanol.
“A polÃtica norte-americana de bioenergia nos motivou a fazer a comparação do cenário desse setor em outros paÃses”, disse Furtado.
No caso do Brasil, os autores da publicação creditam a vice-liderança do paÃs na área à s iniciativas de produção de etanol de cana-de-açúcar com tecnologia de ponta.
Em razão da experiência adquirida com o desenvolvimento e a integração de programas de produção de biocombustÃveis, o Brasil apresenta um grande potencial para desenvolver produtos bioquÃmicos e biocombustÃveis nos próximos anos.
Atualmente, as maiores instituições de apoio ao desenvolvimento de bioprodutos no paÃs são o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e a FAPESP, apontam os autores da publicação.
“Um dos mérito da publicação é mostrar que o Brasil não é somente um celeiro de recursos renováveis, como também de capacidade cientÃfica e de vontade polÃtica”, avaliou Marques.
Segundo o especialista, além dos casos de sucesso, o compêndio também reúne projetos que fracassaram porque não conseguiram se tornar viáveis industrial e comercialmente.
Algumas das razões para estarem na publicação é porque ilustram o grau de incerteza de sucesso no setor e porque podem servir de lição para quem está disposto a entrar e investir nessa seara, disse Marques.
“Talvez seja possÃvel aprender muito mais com o casos de fracasso do que com os de sucesso, até mesmo porque os casos de sucesso, propriamente ditos, são muito poucos”, estimou.
Novos lançamentos
Durante o BBEST também foram lançados os livros Production of etanol from sugarcane in Brazil, de Márcia Azanha Ferraz Dias de Moraes, professora da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da USP (Esalq-USP), e David Zilberman, professor da University of California em Berkeley, nos Estados Unidos, e Roadmap for sustainable aviation biofuels for Brazil – a Flightpath to aviation biofuels in Brazil.
Editado por LuÃs Augusto Barbosa Cortez, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o livro é resultado de umprojeto financiado conjuntamente pela FAPESP, Boeing e Embraer, com o objetivo de estimular a pesquisa e o desenvolvimento de biocombustÃveis para aviação no Brasil.
Cortez também é o presidente da Bioenergy Society (SBE), lançada oficialmente durante o evento.
O objetivo da entidade é promover a implantação de bioenergia sustentável no Brasil e em outros paÃses e estimular a formação de pesquisadores na área.
“Queremos contar com a participação de pesquisadores internacionais de renome na área na construção da SBE”, disse Cortez, durante a apresentação dos objetivos da entidade.
Mais informações sobre o BBEST em http://www.bbest.org.br/Â