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Boletim Eletrônico Nº 1318

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17/05/2018



Zarbin: "Ciência e Educação não funcionam sem investimento continuado"


Presidente da SBQ alerta para o descaso do governo com o sistema de pesquisa científica e tecnológica no País

Depois de dois anos à frente da SBQ, o professor Aldo José Gorgatti Zarbin (UFPR), passará o bastão da presidência ao professor Norberto Peporine Lopes (FCFRP-USP) na 41ª Reunião Anual, que começa na próxima segunda-feira, em Foz do Iguaçu.

Zarbin, que coordena o Grupo de Química dos Materiais da UFPR, onde leciona desde 1998, teve seu mandato marcado pelo combate à degradação das condições para o ambiente da pesquisa científica no Brasil, pela continuada inserção internacional da SBQ e o fortalecimento da presença regional da Sociedade dentro do País.

Autor de 138 artigos com quase três mil citações, Zarbin passa a integrar a o Conselho Consultivo da SBQ. Ele concedeu à seguinte entrevista ao Boletim SBQ:

Professor Aldo Zarbin (UFPR): "Estive em todos os encontros regionais da SBQ nos dois anos de mandato, além de inúmeros eventos locais e específicos, de norte a sul, leste a oeste do Brasil. A Química desenvolvida nesse país é fascinante, e tem uma forte identidade, conseguindo manter as características regionais"

1. Os dois anos de seu mandato foram marcados externamente por uma queda substancial no orçamento das universidades federais. É possível avaliar as consequências dessa queda a médio e longo prazos?
R. Não só no orçamento das universidades federais, mas também em todo o sistema nacional de ciência, tecnologia e inovação. O meu mandato na SBQ praticamente coincidiu com a chegada do grupo que ainda hoje se mantém no controle do país, e esse grupo demonstrou claramente que educação, ciência e tecnologia não são prioridades - indo na contramão da velha receita, conhecida por todos, de que o melhor investimento para um país crescer, em toda a sua dimensão, é exatamente em educação, ciência e tecnologia.

A fusão do antigo MCTI com o Ministério das Comunicações, os cortes no orçamento das agências e do próprio ministério, os cortes nos orçamentos das Universidades Federais (que no Brasil têm um aspecto diferenciado e de relevância dobrada, uma vez que 80% do conhecimento científico gerado aqui vem das universidades públicas), a submissão e posterior aprovação pelo Congresso Nacional da Emenda Constitucional que congela os investimentos pelos próximos 20 anos (chamada de emenda do fim do mundo), são algumas, dentre várias outras, das demonstrações inequívocas do desinteresse, a partir dos atuais governantes, pelo desenvolvimento da educação, CT&I no Brasil. Veja que esses são exatamente os temas diretamente relacionados às atividades da SBQ, pelos quais a SBQ se propõe a atuar, para inclusive justificar sua finalidade estatutária de desenvolver, integrar, divulgar e promover a pesquisa, a educação e a aplicação responsável do conhecimento químico, como forma de impulsionar o desenvolvimento humano e socioeconômico sustentável do Brasil e do mundo.

Respondendo agora diretamente à sua pergunta, estamos ainda vivendo com as sobras do que tínhamos, com a estrutura que foi montada, portanto os efeitos ainda não estão se fazendo sentir de forma muito vigorosa. Mas ciência e educação não funcionam sem investimento continuado, e a médio e longo prazo começaremos a sentir as consequências. Os equipamentos vão começar a quebrar e não teremos recursos para consertá-los; os insumos já estão começando a minguar; o sistema de pós-graduação, responsável por mais de 90% da produção científica do país, não cresce, as bolsas para os alunos estão com os valores congelados, o que as torna cada vez menos atrativas, e dessa forma a roda deixa de rodar, ou vai rodando cada vez mais vagarosa e defeituosa; e sem contar o exército de doutores desempregados que estamos formando, o que vai acarretar em uma fuga de cérebros do país, como infelizmente já estamos experimentando.

Com relação a esse assunto, sou bastante orgulhoso da postura que tivemos e na rapidez de reação frente a todos os ataques que as áreas da Educação e da CT&I sofreram e vêm sofrendo no período. A SBQ esteve na frente de batalha na luta pela dignidade dessas áreas, em inúmeras ações, como nos trabalhos conjuntos entre mais de 50 Sociedades Científicas no Congresso Nacional, em Brasília, pelos recursos para CT&I na LOA/2018. Posso afirmar com absoluta certeza que transmito ao meu sucessor uma SBQ respeitada em todos os níveis, pela postura firme e não acovardada na luta pela qualidade e desenvolvimento da Educação, CT&I no Brasil.

2. Nesse período o Sr. esteve em eventos científicos em todas as regiões do país. Gostou do que viu?
Gostei, e gostei muito. Estive em todos os encontros regionais da SBQ nos dois anos de mandato, além de inúmeros eventos locais e específicos, de norte a sul, leste a oeste do Brasil. Além de falar sobre a importância da SBQ e da representatividade em todas essas ocasiões, pessoalmente essa experiência foi impagável, pois me permitiu um aprendizado que é difícil de conseguir de outra maneira sobre as pessoas, os interesses, o tipo de ciência e de preocupação de cada lugar. Sou extremamente grato por isso. A Química desenvolvida nesse país é fascinante, e tem uma forte identidade, conseguindo manter as características regionais. Pude comprovar pessoalmente o que havia destacado no meu discurso de posse, que a Química Brasileira mudou desde a criação da SBQ, se descentralizando cada vez mais, e que era preciso compreender isso e tornar o B da SBQ cada vez mais representativo.

3. A inserção da Química brasileira no cenário internacional progrediu muito nos últimos anos, sobretudo com a realização da IUPAC 2017 no Brasil e a primeira conferência do Atlântico. O que falta para termos um Nobel brasileiro?
Investimento continuado em patamares relevantes e inteligentemente direcionado, nos tópicos que a Química e a ciência brasileira têm vocação; valorização da educação e ciência e planejamento a longo prazo. Não se ganha um Nobel da noite para o dia, nem de um ano para o outro, ou de um governo para o outro. Um Nobel é fruto de trabalho continuado e de planejamento, o que estamos cada vez mais distantes, infelizmente.

A inserção internacional da química brasileira é um processo que vem experimentando um crescimento nos últimos 20 anos, e creio que atingiu o ápice pela IUPAC-2017, e o sucesso absoluto desse evento. É preciso lembrar que respondemos por cerca de 2% de todo conhecimento novo gerado em Química no mundo, o que nos coloca entre os 15 países que mais publicam na área, além de termos uma indústria química que é a oitava potência mundial. Não se esperaria algo muito diferente do que um reconhecimento internacional à altura desses números. As ações da SBQ nos últimos anos, se internacionalizando cada vez mais, se aproximando das sociedades e agentes do exterior, e o êxito da IUPAC-2017 no Brasil, foram a cereja do bolo nesse processo.

4. Nos últimos anos o Sr. participou do "pint of science" , iniciativa para levar conversas científicas a ambientes fora das universidades. Como foi essa experiência? Ciência é um assunto que fascina o brasileiro?
Essa é uma questão da mais absoluta importância, e a meu ver toca no ponto que é a chave para o nosso futuro enquanto nação soberana, que é a popularização da ciência, e a conscientização da sua importância pelo publico leigo. Em dezembro de 2016 eu escrevi um editorial para o JBCS com o título "é preciso resistir", onde eu levantava que os ataques que a CT&I já começavam a sofrer poderiam ser estancados caso a população tivesse consciência da sua importância no seu dia-a-dia, e que os cientistas precisavam urgentemente sair dos seus laboratórios e se aproximar da população, dando-lhes a verdadeira dimensão da atividade científica e de como isso importa na vida do cidadão comum.

O brasileiro gosta muito de ciência, é curioso por natureza, e extremamente fascinado pelo aprendizado, principalmente de temas que a primeira vista lhes parece tão distante. Ações que popularizem e divulguem a ciência são fundamentais. Nesse sentido, o "pint of science" é absolutamente fantástico. No meu caso específico, aqueles que me conhecem sabem que ciência e cerveja fazem parte das minhas grandes paixões, e juntar os dois em um único evento foi inesquecível. Falei por 35 minutos sobre Nanociência e Nanotecnologia (enquanto bebia cerveja, diga-se de passagem), para uma plateia que foi estimada em 150 pessoas, e depois fiquei mais de uma hora respondendo perguntas, de gente que não era ligada à academia. Foi fascinante e inesquecível.

5. O trabalho na SBQ é voluntário e bastante intenso. Enquanto presidiu a Sociedade o Sr. não deixou de lado suas atividades acadêmicas. Quais seus planos agora?
O Prof. Vitor Ferreira, ex-presidente da SBQ na gestão na qual eu fui o Secretário-Geral, cunhou uma frase durante sua gestão que marcou profundamente a todos, pela sua simplicidade e profundidade. Ele dizia que trabalhar para a SBQ era extremamente gratificante, mas que era preciso trazer a SBQ no coração. Quer dizer que se você tem amor por essa sociedade, o trabalho intenso é naturalmente retribuído. Tenho a SBQ no coração desde a primeira vez que participei de uma Reunião Anual, como estudante de graduação nos anos idos de 1988, e tenho a sorte de ter tido companheiros de Diretoria e Conselho nessa jornada que têm o mesmo sentimento. Aliás, quero aproveitar a oportunidade para agradecer profundamente todos os membros da Diretoria & Conselho, em especial a professora Rossimiriam Freitas, nossa Secretária-Geral que trabalhou arduamente nesses dois anos em prol da nossa Sociedade; agradecer aos Diretores e membros das diretorias das divisões científicas; os secretários regionais e membros das secretarias; os editores das nossas revistas; e todo o corpo de funcionários da SBQ e das editorias - e nesse último caso o faço em nome da Sra. Dirce Campos, nossa diretora executiva que traz a SBQ no coração desde a sua fundação. Esse organismo vivo que é a SBQ acaba se transformando em uma grande família, e é um dos responsáveis pelo prazer no trabalho voluntário.

Estatutariamente o Presidente se torna membro do Conselho Consultivo no período imediatamente posterior à sua presidência, então estarei ainda trabalhando bastante pela SBQ no Conselho, na próxima gestão, e sempre pronto a atender os pedidos do Prof. Norberto, nosso próximo presidente, para ajudar no que for preciso. O trabalho de representatividade me agrada profundamente, porque acredito na sua importância. Estarei sempre, onde quer que esteja, trabalhando pelo crescimento da nossa SBQ, da Química e da Ciência brasileiras.

6. Que mensagem deixa para seu sucessor?
Tenho a sorte e satisfação de ser sucedido por um grande cientista e trabalhador incansável pela SBQ, meu amigo Norberto Peporine Lopes, que fará um grande trabalho pela SBQ. A presidência exige presença, exige saber o momento de ser rígido e o momento de ser flexível, exige muita humildade, exige sapiência para se fazer representante de uma área que é ampla e muitas vezes com fronteiras difusas, exige estar aberto para entender as diferenças, que são muitas, e exige paciência para o diálogo com os diferentes. Tenho certeza que o Norberto tem plena consciência disso tudo.


Texto: Mario Henrique Viana (Assessor de Imprensa da SBQ)








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