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13/9/2012



Ciência precisa ser mais aberta e interativa


Agência FAPESP – Em junho de 2011, um surto de contaminação na Europa causado por Escherichia coli forçou as instituições de pesquisa em diversas partes do mundo a publicarem na internet os dados de que dispunham sobre o genoma da bactéria para agilizar e facilitar o reconhecimento da cepa causadora da infecção.

Por meio da cooperação científica internacional, se descobriu que se tratava de uma nova cepa, resultante da combinação do material genético de outras duas cepas de E. coli, que era resistente a 18 tipos de antibióticos e libera no organismo humano uma toxina, denominada shiga, que causa a falência dos rins.

A partir do sequenciamento genético da nova cepa da bactéria, foi possível desenvolver um teste, chamado PCR em tempo real, que possibilitou a triagem em apenas algumas horas dos pacientes contaminados para receberem tratamento adequado, e desta forma controlar o surto de contaminação que poderia tomar proporções globais.

Na avaliação de Jessica Bland, conselheira científica da Royal Society do Reino Unido, o exemplo é bastante ilustrativo de como se pode realizar ciência de formas mais aberta e interativa que, segundo ela, representam alguns dos maiores desafios científicos da atualidade e que devem ser superados em breve devido a pressões sociais.

“A ciência terá que rever a forma como disponibiliza os dados que gera desenvolvendo, por exemplo, novas práticas computacionais”, disse Bland durante a conferência que proferiu no 1º Encontro Preparatório para o Fórum Mundial da Ciência 2013, realizado nos dias 29 a 31 de agosto na FAPESP.

De acordo com a especialista, alguns dos fatores que estão impelindo esta mudança de paradigma da ciência é o aumento da demanda pelo acesso a dados científicos.

De um lado, os cidadãos e os legisladores estão necessitando, cada vez mais, de evidências científicas para dar suporte para tomada de decisões em relação a questões como os transgênicos, que tem mobilizado a opinião pública do Reino Unido, onde recentemente ocorreu um protesto em que manifestantes reclamaram da falta de discussão sobre o assunto.

Por outro lado, as empresas também necessitam ter maior acesso aos resultados das pesquisas científicas, que podem dar origem a inovações tecnológicas e aumentar sua competitividade.

“Hoje está em curso uma discussão no Reino Unido e na Europa sobre como possibilitar a abertura de dados científicos por empresas, que podem se converter em desenvolvimento econômico”, contou Bland.

Entretanto, segundo ela, um dos fatores que estão impedindo o acesso dos dados científicos até mesmo pelos pesquisadores é o fato de que não estão disponibilizados de forma racional.

“Não basta apenas abrir os dados científicos. É preciso disponibilizá-los de forma que sejam acessíveis, inteligíveis, avaliáveis e reutilizáveis”, afirmou Bland.

“A abertura de dados por si só não tem valor. Somente quando esses quatro critérios forem atendidos pode se considerar que os dados científicos estão devidamente abertos”, avaliou.

Limites para abertura de dados científicos

Um dos limites à abertura de dados científicos apontados por ela são interesses comerciais legítimos.

Entretanto, segundo Bland, as instituições de pesquisa já dispõem de mecanismos para proteger suas descobertas, que podem resultar em patentes ou recebimento de royalties.

Na Europa, por exemplo, algumas instituições de pesquisa desenvolveram um sistema que possibilita que indústrias farmacêuticas possam comparam seus bancos de dados de moléculas com os delas, por exemplo, sem que tenham acesso às informações estratégicas uma das outras, que podem resultar no desenvolvimento de um novo fármaco.

“Isso mostra que as instituições de pesquisa não precisam ser totalmente fechadas em relação à publicação de seus dados. Elas podem disponibilizá-las em um sistema seguro”, indicou.

De acordo com ela, outro limite à abertura dos dados científicos, também ilustrado por outro exemplo recente, é a segurança.

Em agosto de 2011, cientistas dos Estados Unidos e do Japão submeteram dois artigos para avaliação das revistas Nature e Science, em que relatam os resultados de uma pesquisa sobre um vírus da gripe aviária modificado em laboratório que desenvolveram juntando o vírus da gripe aviária com o da gripe suína (H1N1).

A publicação dos artigos foi embargada após um pedido do governo americano que alegou que as descobertas poderiam ser utilizadas por terroristas para desenvolver armas biológicas, e dividiu opiniões – a Organização Mundial da Saúde (OMS) defendia a publicação, enquanto órgãos de segurança dos Estados Unidos se manifestaram contrários.

No início de maio de 2012, a Nature ignorou o pedido do governo americano e publicou um dos artigos, sob a alegação de que qualquer informação restrita distribuída aos laboratórios universitários não consegue permanecer na condição de confidencialidade por muito tempo.

“O que nós vemos é que quando os dados científicos são mais abertos, aumenta a segurança, como pode ser visto no caso da publicação dos dados da pesquisa sobre o vírus modificado da gripe aviária. A abertura de assumir o risco de publicar levou a uma situação de maior segurança”, avaliou Bland.

A grande aspiração, segundo a especialista, é que em breve todos os dados científicos possam ser disponibilizados online e que seja possível interoperá-los.

“Os dados são parte integrantes da ciência e precisam ser melhor comunicados e não só incluídos nos artigos científicos”, afirmou. 


Fonte: Agência FAPESP






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