25/4/2013
Impactos do novo plano de carreira docente para as Universidades Federais: remando contra a maré da excelência acadêmica
Artigo de Paulo Roberto Ribeiro de Mesquita para o Jornal da Ciência
A partir do dia 1º de março de 2013 entrou em vigor a Lei Nº 12.772, de 28 de dezembro de 2012, que trata do novo Plano de Carreiras e Cargos do Magistério Federal (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12772.htm). Esta Lei, que se aplica a todas as Universidades Federais e Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia traz sérios problemas ao avanço na qualidade do ensino superior (graduação e pós-graduação) e pesquisa cientÃfica nestas instituições. Aqui será abordado o ponto que talvez seja mais danoso: o novo sistema de ingresso na carreira docente.
Está previsto no art. 8º da referida Lei que o ingresso na carreira docente só ocorrerá no primeiro nÃvel da classe de Auxiliar (o 1º nÃvel da carreira docente), mediante concurso, exigindo apenas diploma de graduação. Neste caso, mesmo que o candidato aprovado tenha o tÃtulo de Doutor terá que permanecer na classe de Auxiliar por três anos, pois não poderá pedir progressão por titulação para a classe de Adjunto antes do estágio probatório (art. 13).
Apesar dos aumentos reais de salário nos diferentes nÃveis da carreira docente, este novo plano de carreira não beneficia os doutores nos três primeiros anos da carreira. Acontece que mesmo com um adicional no salário referente à Retribuição por Titulação, com os valores que serão aplicados a partir de 2015, o nÃvel salarial de Auxiliar 1 apresenta uma perda real de 2% em relação ao salário atual de Adjunto 1.
Desse modo, a impossibilidade de concurso direto para a classe de Adjunto e a não valorização salarial reduz drasticamente a atratividade da carreira docente para os melhores talentos que estão sendo formados entre os mais de 10 mil doutores todos os anos. Além disso, no momento em que o paÃs está investindo intensamente na formação de doutores e pós-doutores no exterior, através do Programa Ciência sem Fronteiras, a fixação destes talentos em universidades federais quando retornarem ao Brasil está sendo desestimulada.
A exigência apenas do diploma de graduação para ingresso na carreira docente é, com certeza, o maior retrocesso do novo plano de carreira docente. A comunidade cientÃfica, juntamente com as agências de fomento e os órgãos governamentais (MCTI e MEC), buscou durante décadas aprimorar o sistema universitário para que este atenda à s necessidades do paÃs, através do fomento à pós-graduação, pesquisa e, mais recentemente, a inovação. Eis a pergunta: se o desenvolvimento da pós-graduação, pesquisa e inovação nas universidades federais demanda um corpo docente altamente qualificado (doutores), o que justifica a exigência de somente diploma de graduação no novo plano de carreira?
Ressalta-se que pelas polÃticas de desenvolvimento da pesquisa cientÃfica e inovação praticadas atualmente no paÃs pelas agências de fomento (CNPq, FINEP, CAPES e FAPs), só podem concorrer à grande maioria dos editais destas agências docentes que tenham tÃtulo de doutorado.
A titulação do corpo docente também está relacionada com a qualidade dos cursos de graduação. O próprio MEC reconhece isso, pois na avaliação dos cursos de graduação de todo o paÃs um dos indicadores utilizados é a "Titulação do Corpo Docente do Curso", e só estabelece nota máxima (nota 5) nesse indicador para os cursos "quando o percentual dos docentes do curso com titulação obtida em programas de pós-graduação stricto sensu (mestrado ou doutorado) é maior ou igual a 75%". Desse modo, verifica-se um descompasso entre o novo plano de carreira e as polÃticas praticadas pelo próprio Ministério da Educação.
Outra consequência, a curto prazo, do ingresso de professores com apenas o diploma de graduação será o provável afastamento destes docentes após os três anos de estágio probatório, para realização de cursos de mestrado e doutorado. Esta obtenção do tÃtulo de doutorado pelo corpo docente já é e continuará sendo incentivada pelo sistema acadêmico, mas implicará no afastamento desses docentes por até seis anos (contando mestrado e doutorado), com a consequente necessidade de contratação de professores substitutos durante este perÃodo.
Portanto, o aqui exposto mostra os grandes prejuÃzos que serão causados pelo novo plano de carreira docente ao sistema universitário federal, caso esta Lei continue do jeito que está. Ela vai de encontro a todos os esforços promovidos pela comunidade cientÃfica e os próprios órgãos governamentais. A SBPC e a ABC (http://www.sbpcnet.org.br/site/busca/mostra.php?id=1800), sociedades cientÃficas (http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=86580) e até a CAPES (http://boletim.sbq.org.br/noticias/n898.php) já manifestaram sua preocupação com a aprovação desta Lei.
Para os nossos governantes e gestores públicos fica uma pergunta básica: este novo plano de carreira docente contribui para a obtenção de uma universidade de excelência e que possa atender as necessidades do paÃs? Ora, se já se avista a tempestade no horizonte ainda há tempo de ajustar as velas e retornar para o caminho que levará ao desenvolvimento social sustentável!
Paulo Roberto Ribeiro de Mesquita é Doutorando em QuÃmica e Coordenador de Ensino, Pesquisa e Extensão da Associação dos Pós-Graduandos da Universidade Federal da Bahia (APG-UFBA).
Fonte: Jornal da Ciência
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