10/12/2015
IN MEMORIAN – Nicola Petragnani
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Nicola Petragnani (1929 - 2015) |
O Professor Nicola Petragnani faleceu neste sábado, 5 de dezembro de 2015, deixando a Química brasileira órfã de um de seus principais personagens. O "Professor Nicola", ou simplesmente "Nicola", foi daqueles tesouros do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQUSP) que só são descobertos quando procuramos saber e entender a "razão de ser" de certos aspectos da Química brasileira. Um dos últimos alunos formados pelo Prof. Heinrich Rheinboldt, o Nicola chegou a São Paulo em 1947, vindo de Roma, para concluir sua formação em Química iniciada na Itália. Sua vinda se motivou pela situação pós-guerra da Europa.
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A verve para a Academia talvez tenha sido herdada de berço pois foi filho do sanitarista italiano Giovanni Petragnani, de carreira acadêmica brilhante.1 Em sua carreira, o Prof. Nicola viria então a expandir amplamente um campo de pesquisas que se transformou em uma das maiores escolas de química brasileiras: a da química orgânica do Selênio e do Telúrio.
Após graduar-se como bacharel em 1951, iniciou seu doutorado sob a orientação do Prof. Heinrich Rheinboldt, onde trabalhou com a preparação de certos compostos orgânicos de Telúrio, teluretos diarílicos, a partir de reagentes de Grignard. Entre seus colegas orientados pelo Prof. Rheinboldt, estava o Prof. Geraldo Vicentini, que também estudou a Química Orgânica de compostos de Telúrio em sua tese de doutorado.
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O falecimento do Prof. Rheinboldt em 1955 levou o Prof. Nicola a conduzir seus estudos de modo mais independente. Antes de defender seu doutorado, assumiu um cargo de Químico no Instituto Butantan, a convite de Isaías Raw, de 1956 a 1957. Defendeu sua tese de doutorado em 1957 e continuou trabalhando com o Prof. Isaías; agora como professor assistente, na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - nessa interação envolveu-se com estudos sobre óxido-reduções biológicas até 1959.2 Após esse período, o Prof. Nicola passou a atuar como docente do Departamento de Engenharia Química da Escola Politécnica da USP, sendo assistente do Prof. Marcello de Moura Campos, então catedrático de Química Orgânica até 1961. Retomou sua atuação com a Química Orgânica de compostos de Telúrio – foram anos muito profícuos. Em conjunto com o Prof. Moura Campos, relatou os primeiros estudos sobre reações de ciclofuncionalização envolvendo reagentes eletrofílicos de Selênio e Telúrio3 – tipo de reação que seria re-estudada por K. C. Nicolaou décadas depois, utilizando reagentes eletrofílicos de Selênio e impactando a Síntese Orgânica.4 Com a reforma universitária da USP, o Prof. Nicola, junto com o grupo de Química Orgânica composto pelos Profs. Luciano do Amaral e Vicente Toscano e liderado pelo Prof. Moura Campos, instalaram-se no atual IQUSP.
Estabelecendo seu grupo de pesquisas no IQUSP, tornou-se professor titular em 1978, atuando em Química Orgânica onde se contemplavam também estudos envolvendo compostos orgânicos de Selênio e de Telúrio. Entre seus orientandos estiveram a Profa. Ursula Brocksom, J. V. Comasseto, L. Castellano, Helena Ferraz, Gil Valdo J. da Silva, Massami Yonashiro e José Ricardo Romero.
O laboratório capitaneado pelo Prof. Nicola, no "bloco 11 superior", teve um papel de destaque em um capítulo importante da consolidação da Química Orgânica brasileira, pois o Prof. Nicola foi o coordenador brasileiro do sub-programa de Síntese Orgânica do histórico convênio entre o CNPq e a National Academy of Sciences (NAS).5 Durante essa época virtuosa, iniciada em 1969, estabeleceu-se um trânsito internacional no laboratório com docentes, jovens doutores e pós-doutores estrangeiros alguns dos quais acabaram por se estabelecer no Brasil, como o Prof. Timothy Brocksom.6 Eminentes químicos orgânicos, como Carl Djerassi, William Johnson, Robert Ireland, Ernest Wenkert e E. Marshall estiveram envolvidos nesse importante projeto. Nesse período, também fez parte da equipe do laboratório, Simon Campbell,7 que por motivos de ordem pessoal retornou à Inglaterra e foi trabalhar na Pfizer, onde, entre outros projetos, liderou a equipe de desenvolvimento de anti-hipertensivos que esbarrou na descoberta do Viagra.
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Prof. Nicola Petragnani recebendo do
Prof. Oswaldo Alves a medalha Simão Mathias durante a 23ª RASBQ.
(fonte: www.sbq.org.br). |
A atuação do Prof. Nicola merece reverência, na medida em que não se restringiu a sua linha de pesquisas. Também transcendeu para um serviço voltado à então pequena, mas crescente comunidade de químicos orgânicos brasileiros. Ao estabelecer uma cultura internacional a sua volta, deu lastro para alavancar uma geração inteira de pesquisadores, impactando na qualidade da química orgânica realizada naquele momento e a das próximas gerações. Prof. Nicola colaborou como professor de Química Orgânica quando da implantação do IQ-UNICAMP.
A contribuição do trabalho do Prof. Nicola o conduziu ao reconhecimento como "Pai da Química Orgânica do Telúrio" , nas palavras do Prof. Derek H. R. Barton, laureado com o Nobel em Química em 1969. A contribuição do Prof. Nicola refletiu-se em mais de cem trabalhos publicados e no livro Tellurium in Organic Synthesis, cuja segunda edição contou com a colaboração do Prof. Hélio A. Stefani, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP. A interação entre o Prof. Nicola e o Prof. Hélio floresceu, além da ciência, em uma grande amizade. Entre diversas distinções acadêmicas, em 1996 o Prof. Nicola foi reconhecido, pela Presidência da República, com a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico.
Além de toda essa atuação científica, o Prof. Nicola ainda era artista plástico. Construiu esculturas a partir dos mais diversos materiais: tubos-aves, roldanas-gatos, cabos-insetos, plantas e figuras humanoides. Seu ateliê ficava no Guarujá, onde tinha o costume de nadar em alto-mar no trecho entre Guarujá e Santos.
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A presença do Prof. Nicola no Bloco 11 do IQUSP formava junto com o grupo do Prof. Comasseto e o grupo da Profa. Helena Ferraz uma importante fração da Química Orgânica Sintética do IQUSP. Sua sala estava sempre aberta para receber as pessoas e ele tratava todos como filhos e filhas, enquanto, na realidade, todos os alunos ali éramos seus netos e netas.
Cabe destacar a grande modéstia do Prof. Nicola no que se refere a sua contribuição científica. Embora reconhecido internacionalmente pelo pioneirismo no desenvolvimento de reagentes de Organo-Telúrio, jamais ouvimos dele qualquer expressão de vangloriar-se deste fato.
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Prof. Nicola emocionado ao entrar no coquetel do simpósio em sua homenagem em 2009 |
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Nicola Petragnani e Simon Campbell em 2009 |
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Moura Campos quebra o protocolo para contar uma deliciosa história do Nicola em 2009 |
É, portanto, com muito pesar que perdemos um grande cientista e um grande amigo. Descanse em paz Nicola que você será sempre lembrado.
1 O Prof. Giovanni Petragnani foi notável por sua contribuição nos estudos sobre o bacilo de Koch e a produção de vacinas para tratamento de tuberculose. Chegou a ser reitor da Universidade de Siena (1932-1935) e foi diretor geral de Saúde Pública na Itália entre 1935 e 1943.
2 (a) Petragnani, N.; Nogueira, O. C.; Raw, I. “METHAEMOGLOBIN REDUCTION THROUGH CYTOCHROME-B5” Nature 1959, 184, 1651. (b) Raw, I.; Petragnani, N.; Nogueira, O. C. “STUDIES OF ELECTRON TRANSPORT ENZYMES .4. OXIDATION AND REDUCTION OF CYTOCHROME-B5 BY RAT LIVER MITOCHONDRIA” J. Biol. Chem. 1960, 235, 1517.
3 Moura Campos, M.; Petragnani, N. “DARSTELLUNG VON α,α-DISUBSTITUIREN δ-ARYLTELLURO-γ-VALEROLACTONEN” Chem. Ber. 1960, 93, 317.
4 Nicolaou, K. C.; Lyzenko, Z. “PHENYLSELENOLACTONIZATION - EXTREMELY MILD AND SYNTHETICALLY USEFUL CYCLIZATION PROCESS.” J. Am. Chem. Soc. 1977, 99, 3185.
5 (a) Senise, P. In: Origem do Instituto de Química da USP – reminiscências e comentários, Instituto de Química da USP: São Paulo, 2006. (b) Brocksom, T. J. “O PROGRAMA NAS/CNPq: AVALIAÇÃO DE UM PARTICIPANTE” Quim. Nova 2007, 30, 1394; (c)Comasseto, J. V. “Selenium and Tellurium Chemistry: Historical Background” J. Braz. Chem. Soc. 2010, 21, 2027.
6 Atuação conjunta do Prof. Nicola com o Prof. T. J. Brocksom foi muito frutífera tendo desempenhado um papel muito importante na formação de uma geração de químicos orgânicos sintéticos.
7 A interação de Campbell com o grupo se traduziu em dois artigos: (a) Campbell, S. F.; Constantino, M. G.; Brocksom, T. J.; Petragnani, N. “An approach to the synthesis of Bakkenolide A” Synth. Commun. 1975, 5, 353 e (b) Campbell, S. F.; Romero, J. R.; Petragnani, N.; Brocksom, T. J. “aN approach to the generation of a new reactive intermediate: 4,5-dehydrocycloheptatriene” Cien. Cult. 1976, 28, 1337.
Por José M. Riveros e Rodrigo L. O. R. Cunha
Carlos Roque D. Correia, IQ/Unicamp
O professor Nicola Petragnani deixa uma marca indelével na Química e na alma de muitos brasileiros, mesmo aqueles que pouco conviveram com ele.
Sua vida inspirou diversas gerações de alunos, professores e colegas de trabalho.
Seu legado jamais será esquecido por todos aqueles que tiveram contato com a pessoa afável e seu excepcional trabalho profissional e artístico.
Gelson Perin, UFPel
Com o professor Nicola aprendi que uma reação antiga ou simples não é sinônimo de química feia e que química bonita é aquela que você consegue fazer com aquilo que está disponível na sua prateleira.
Diogo S. Lüdtke, IQ-UFRGS
Falar sobre as diversas contribuições científicas do Prof Nicola seria uma redundância, já que esses aspectos já estão muito bem apresentados na sua biografia. Meu depoimento é pessoal.
Eu, particularmente, tinha uma grande admiração e carinho pelo Prof. Nicola, que fez parte da banca da minha tese de doutorado e com o qual tive o privilégio de conviver durante meu período como professor na FCF/USP.
Dono de uma excelente memória para artigos científicos e sempre disposto a uma boa conversa, particularmente sobre a química do telúrio, não raro vinha com anotações de possíveis reações e a tradicional frase "Filho, podia testar isso pra mim?"
Sempre cordial, humilde e simpático, certamente sua figura carismática nunca será esquecida por aqueles que tiveram o privilégio de conhecê-lo.
Timothy Brocksom, UFSCar
É com enorme tristeza que me despeço do Prof. Dr. Nicola Petragnani, Prof. Titular aposentado do IQ-USP. Em 1972, mudei para São Paulo para trabalhar no programa NAS-CNPq (veja Quim. Nova, 2007, 30, 1394), em colaboração com Nicola, e passei a conhecer e conviver com uma pessoa maravilhosa tanto nos aspectos profissionais, bem com no sentido pessoal. O nosso convívio acadêmico permitiu combinar as químicas de selênio e telúrio, e as lactonas sesquiterpênicas. Por um lado, investigamos as reações de Wittig com reagentes de selênio (J. Organomet. Chem., 1977, 124, 1) e também iniciamos os estudos da química de isopropilamideto de lítio e do produto natural baquenolida-A. Ao mesmo tempo, passei a admirar a pessoa NP com o seu jeito muito italiano de ser: as constantes brincadeiras saudáveis da convivência anglo-italiano, conhecer o então paraíso da ilha Guarujá e a belíssima casa do Nicola, e as suas preferências culinárias junto com a Sema. Poucas sabem da habilidade imensa do Nicola em criar verdadeiras obras de arte em metal, na oficina montada na sua casa em Guarujá, ou a sua capacidade de nadar distancias impressionantes no mar nem sempre calmo. Nunca vou deixar de lembrar a sua inclinação para executar reações perigosas e dirigir carros esportes em velocidades excessivas. Quero destacar as importantes publicações já na década de sessenta, frequentemente em colaboração com o Prof. Marcello de Moura Campos, numa época de dificuldades tremendas para a execução de pesquisa no Brasil. Assim, Nicola deixa uma obra científica muito relevante e importante, justificando a sua posição como o pai da Química Orgânica de selênio e telúrio. Ciao, Nicoló.
Vitor F. Ferreira, UFF
Tive pouca interação com o Prof. Nicola Petragnani, pois sua área de pesquisa era bem diferente do que fazia. Porém, me encantava muito seus seminários. Do nosso contato lembro pouco. Lembro da sua arte que era muito boa e de uma estória que me contou. Deve ter contado ela para muitas outras pessoas. Prof. Nicola era um excelente nadador. Um vez nadando em mar aberto, já distante da praia, fez um aceno para sua esposa. Nisso dois salva-vidas viram o sinal e interpretaram isso como pedido de socorro e foram lá e arrastaram ela para fora da mar. Ele ficou muito bravo, ao estilo italiano, e quase bateu nos salva-vidas. Sem dúvida a partida do Prof. Nicola entristece o mundo da química, especialmente o munda da química do selênio e telúrio que foi a sua grande paixão e que o levou a ter reconhecimento internacional.
Oscar Rodrigues, UFSM
Tive o prazer de conhecer o prof. Nicola em congressos e pelo que pude perceber, o prof. era uma pessoa singular, com um conhecimento de ciência e com um senso de humanidade únicos. O prof. Nicola tinha a incrível habilidade de poder conectar átomos como cientista e, como artista, de conectar metais e madeira criando formas especiais, de uma sensibilidade singular. Fica o seu legado como grande escultor da química dos calcogênios e, como artista, um alquimista que, com o toque único, deu vida a metais e madeiras.
Marta Nunes, UERGS
Na química, creio eu que em outras áreas também, (re)conhecemos a nossa "família" e "árvore genealógica" da pós graduação. O professor Nicola, esta figura admirável, foi meu "bisavó" por parte do mestrado e "avó" por parte do doutorado! Convivi com ele diariamente durante o doutorado e a sua sala ficava do lado da nossa sala de estudos no Instituto de química USP. Lembro das inúmeras vezes em que bateu na nossa parede quando estávamos muito agitados ou a origem do barulho não era exatamente a química. Chamava a quase todos, carinhosamente, de "filho" ou "filha", assim não precisaria lembrar os nomes. Levando em consideração os anos, décadas, de contribuição na formação de tantos pós graduandos... era na verdade uma estratégia de sobrevivência! Descanse, merecidamente, em paz!
Rodrigo L. O. R. Cunha, UFABC
Meu convívio com o Prof. Nicola se restringiu ao período de minha graduação e doutoramento no IQUSP, de 1995 até 2005. Fui um de seus netos tardios. Lembro que, ao ingressar na graduação, em 1995, era frequente ver um grupo imponente de professores andarem juntos, provavelmente indo ou vindo de reuniões. Entre eles estavam os professores Riveros, Nicola, Blanka, Senise, Ernesto Giesbrecht e Vicentini – todos do Departamento de Química Fundamental. Dei partida em minha iniciação científica com o Prof. Comasseto e, muito timidamente, comecei a interagir com o Prof. Nicola. Sempre receptivo nas reuniões de grupo ou em conversas diversas, compartilhávamos um ou outro artigo sobre "novidades com Telúrio", além de suas experiências e histórias. Recordo-me de um relato em que ele e o Simon Campbell costumavam ir até o Campo de Marte buscar gasolina azul, encher o carro com galões e levar até o IQ a fim de destilar e assim obter hexano para uso no laboratório. E também da história de Barry Sharpless, Nobel em Química em 2001, chegando em um carrão conversível a uma das International Conferences on the Chemistry of Selenium and Tellurium e perguntar, após a conferência apresentada pelo Prof. Nicola, qual era o gosto dos compostos de Telúrio que ele preparava e, ainda, da ocasião em que ele ficou com câimbra enquanto nadava no meio do mar e ficou, ali na imensidão, esperando passar para poder voltar para casa.
Em 1999, organizei a 16ª edição da Semana da Química do IQ, na qual o Prof. Nicola foi homenageado. Cheguei com muito orgulho a sua sala e o comuniquei da homenagem. O Prof. Nicola ficou surpreso, pois a tempos não tinha contato com os alunos da graduação; pensava que havia muito tempo que ninguém mais o conhecia. "Professor, eu o conheço e isto basta. Meus colegas também precisam conhecê-lo e esta será a oportunidade.", disse-lhe. Bem antes da data do evento, o Prof. Nicola me procurou, preocupado com o que falaria, pois "se falasse sobre química de telúrio, os alunos se aborreceriam...". Pedi então que contasse aos estudantes sua trajetória, e ele o fez. Lamento por não ter feito um registro daquela fala, à qual estiveram presentes os professores Vicentini, Ricardo Feltre, Pitombo e até Isaías Raw, entre outros. Aquele relato de sua trajetória levou seus colegas dos tempos de doutorado de volta ao laboratório na Glete, como podia se notar pelas expressões e pelos olhares distantes.
Este breve convívio do qual desfrutei com o Prof. Nicola fez diferença para mim. E com muita reverência e de coração apertado lamento sua passagem. Mas perceber a dimensão de seu legado - do qual me orgulho de ser fruto – alegra o espírito e nos anima a prosseguir.
Antonio Luiz Braga, DQ-UFSC
Obituário – Nicola Petragnani
Obituário do Acadêmico e químico Nicola Petragnani, que faleceu no dia 5 de dezembro, escrito pelo também membro da ABC Antonio Luiz Braga, químico da UFSC.
Missa em mémoria do Professor Nicola: Dia 14/12/2015, às 10h00.
Local: Igreja São José Endereço: Rua Dinamarca, 32 no Jardim Europa (esquina com a Rua Áustria)
É com pesar que anunciamos o falecimento do Acadêmico Nicola Petragnani, ocorrido em 05 de dezembro de 2015, aos 86 anos. O corpo foi cremado no dia seguinte ao seu falecimento, em Vila Alpina (SP). Nasceu em Roma, em 1929, onde viveu e cursou o 1º ano de Química na Universidade de Roma. Em 1947 mudou-se para o Brasil e continuou seus estudos de Química na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da universidade de São Paulo, onde também se doutorou em 1957, sob orientação do Professor Heinrich Rheinboldt. Foi Químico do Instituto Butantã, docente no Laboratório de Fisiologia da Faculdade de Medicina da USP e professor titular do IQ-USP, onde se aposentou.
Foi Coordenador Brasileiro do Programa Binacional CNPq e National Academy of Science (NAS-USA), na área de Síntese Orgânica, com a participação de renomados químicos orgânicos norte-americanos, como Carl Djerassi (criador da pílula anticoncepcional), William Johnson, Robert Ireland, Ernest Wenkert, entre outros. Simon Campbell, líder do grupo que descobriu o Viagra, também atuou nesse projeto. Esse programa modernizou a área de síntese orgânica no Brasil, com a fixação de vários pesquisadores estrangeiros e a criação de linhas de pesquisa nessa área.
Era membro titular eleito da Academia de Ciências do Estado de São Paulo; Membro Titular da New York Academy of Science; Membro eleito da Academia Brasileira de Ciências e Pesquisador 1A do CNPq.
Recebeu vários prêmios e títulos, com destaque para o Prêmio Hauptmann Rheinboldt de Química, em 1994. Em 1996, foi condecorado com a Grã Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico, pela Presidência da República do Brasil.
O Professor Nicola foi pioneiro no desenvolvimento de moléculas orgânicas contendo selênio e telúrio, atualmente considerada como área de ponta em nível internacional e que é objeto de pesquisa de mais de uma dezena de importantes grupos de pesquisa no Brasil e exterior. Esse legado científico inestimável que deixou o coloca para sempre na história da ciência.
Conheci o Professor Nicola quando cheguei no IQ-USP para realizar meu mestrado. Fui seu orientado por um semestre, em virtude do Prof. Comasseto ainda não estar credenciado no Programa de Pós-Graduação. Neste período, pude conhecê-lo e perceber que se tratava de uma pessoa extraordinária, e uma grande amizade se estabeleceu entre nós. Além de se destacar no campo científico, o Professor Nicola ainda se sobressaia como artista plástico. Seu ateliê ficava no Guarujá, onde ele construía esculturas a partir de materiais recicláveis. Por diversas vezes ele exibiu suas obras em exposições ou em congressos, como o BMOS, Brazilian Meeting on Organic Chemistry.
Por todas essas facetas o Professor Nicola, pai, avô e bisavô científico de vários pesquisadores atuantes no Brasil, será sempre lembrado, principalmente para aqueles que tiveram a oportunidade e alegria de conhecê-lo.
Omar A. El Seoud, IQ-USP
Logo que cheguei ao IQ-USP foi conversar com o Prof. Nicola Petragnani sobre PG. Embora acabei não trabalhando com ele, gostei de seu jeito "alegre" de fazer pesquisa numa época com muito poucos recursos. Basta lembrar o seu moto "um composto por dia, traz muito alegria". Além de químico de renome internacional, pioneiro na química de elementos "estranhos" como selênio e telúrio, foi um artista respeitável, e amante incorrigível do mar. Está fazendo falta sua voz nos corredores do IQ, chamando em tom de brincadeira as outras colegas, ou seu técnico de laboratório, o falecido José Carrasco, que o chamava de José Churrasco!
Luiz F. Silva Jr, IQ-USP
Tive o privilégio de conviver com o Prof. Nicola durante o tempo de aluno de pós-graduação e depois como docente. Durante a pós, um evento marcante foi realizar a disciplina de Síntese Orgânica ministrada por ele pela última vez. Um período de estudo intenso e muitas histórias nas aulas recheadas de referências. Ainda guardo as muitas anotações do período. Além da parte científica, o seu lado artístico mudava a rotina do laboratório, já que se o Nicola visse algo que o interessasse para uma escultura, ele pedia de forma insistente. As proteções das bombas de alto vácuo foram gradativamente desaparecendo. Durante uma reforma, ele queria os contra-pesos das portas da capelas! Mas neste caso, isso era contado e não pudemos ceder! Se alguém reconhecer nas esculturas alguma peça que sumiu do laboratório, talvez não seja mera coincidência! Na ocasião do aniversário de 80 anos do Nicola tive a oportunidade de organizar um simpósio em sua homenagem. Reunimos figuras ilustres, incluindo Simon Campbell que veio ao Brasil especialmente para o evento e o Prof. Moura Campos. Foi extremamente gratificante organizar este simpósio! Sem dúvida o Nicola foi uma pessoa única que marcou a história da Síntese Orgânica no Brasil.
Ronaldo A. Pilli, IQ-UNICAMP
Caros(as) colegas,
Recebi com muito pesar a noticia do falecimento do professor Nicola Petragnani e gostaria de compartilhar com vocês algumas impressões que ficaram marcadas em minha memória do convívio, ainda que pouco frequente, com o professor Nicola.
Ainda como aluno de graduação acompanhava com interesse e admiração os trabalhos desenvolvidos pelo grupo do professor Nicola que eram publicados nas melhores revistas de nossa área, algo raro naquela época para grupos de pesquisa do Brasil. Em meados dos anos 80, quando iniciei minha pesquisa independente, tive a oportunidade de conhecê-lo pessoalmente e passei a admira-lo ainda mais, não apenas por ter sido um dos pioneiros da Quimica de Síntese no Brasil mas pelo carinho com que acolhia as novas gerações ("meu filho" era uma expressão comumente usada por ele…, tendo formado muitas das atuais lideranças em nosso país. Alem do aspecto profissional, seu interesse artístico e humanístico eram marcas de sua personalidade.
A finitude de nossa existência é inescapável mas as marcas que deixamos, essas ficam nas mentes dos que tiveram a felicidade de desfrutar do convívio de seres humanos como o professor Nicola.
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