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23/02/2017



Temer sanciona reforma do ensino médio e secretários da educação apontam dilemas na implementação


Carência orçamentária para a implementação do novo modelo nos estados é uma das críticas comuns à reforma

Secretários estaduais de Educação apontam dilemas para a implementação da lei do Novo Ensino Médio – originada da medida provisória nº 746 –, sancionada no dia 16/02, pelo presidente Michel Temer. As principais diretrizes são os ensinos integral e profissional e a flexibilização da grade curricular que ainda depende da Base Nacional Comum Curricular, o documento que definirá quais os conteúdos obrigatórios para serem ensinados a todos os alunos e que está em processo de elaboração pelo Ministério da Educação.

O acadêmico Isaac Roitman, professor emérito da Universidade de Brasília (UnB), analisou a reforma e considera que a lei do Novo Ensino Médio é pontual, porque trata apenas de parte da problemática do sistema.

"Estamos tão defasados que precisamos dar um salto. Pequenas reformas não vão levar grandes diferenças e já estamos atrasados", disse ele, citando o título de seu artigo produzido recentemente de "o Novo Ensino Médio já nasce velho". Na fase de tramitação, a SBPC divulgou várias notas contrárias ao modelo proposto, uma medida provisória, para se fazer alterações significativas na estrutura do ensino médio.

Na visão do secretário de Educação do Rio de Janeiro, Wagner Victer, a carência orçamentária é uma das grandes dificuldades enfrentadas para implementar as novas diretrizes no Estado. Na prática, as secretarias são responsáveis pela maioria dos alunos matriculados na rede pública.

"A financiabilidade do projeto é uma das questões a serem colocadas. O valor disponibilizado pelo governo para os primeiros dois anos ainda é muito baixo, de cerca de R$ 1,5 bilhão para todos os estados", observa o secretário do Estado que enfrenta crise econômica acentuada.

Na análise de Victer, alcançar o patamar de 50% das matrículas em horário integral em 10 anos, por exemplo, significará o equivalente à necessidade de implementação de mais de uma centena de novas unidades escolares, frente aos "importantes reflexos" na folha de pagamento dos professores e corpo diretivo, nos recursos de merenda escolar e nos valores de manutenção.

"O complemento definido pelo Governo Federal na MP é temporário e não suportará o crescimento e a necessidade do aumento de gastos em pessoal e custeio. É necessário também um programa amplo para construção de escolas com arquitetura própria."

Aquém das necessidades

Pelos cálculos preliminares do secretário no Rio de Janeiro, conforme as metas estabelecidas, o Estado teria de construir 19 unidades escolares anualmente nos próximos 20 anos. "Nos valores de hoje, ao fim da implantação sem considerar o investimento nas novas escolas, o aumento estimado em gastos com custeio, investimento e pessoal poderiam chegar a um acréscimo R$ 1,5 bilhão ao ano, só no Estado do Rio de Janeiro, com reflexos atuariais futuros permanentes para a previdência estadual", destacou.

O secretário carioca considerou, contudo, "significativa" a iniciativa do Governo Federal de encarar politicamente a questão da necessidade de melhorar o Ensino Médio e entendê-lo como prioridade. "A grande questão que ainda não está equacionada é a financiabilidade, pois muitos estados da União como o Rio de Janeiro não recebem complemento do Fundeb e financiam basicamente o Ensino Médio como toda educação básica basicamente por meio do ICMS."

Flexibilização e tempo integral

Uma das principais mudanças da nova legislação é a flexibilização do currículo. Pelas regras atuais, o aluno do ensino médio cursa 13 disciplinas obrigatórias nos três anos. Já no novo modelo, a Base definirá que até 60% das disciplinas serão iguais para todos os alunos devendo incluir obrigatoriamente "estudos e práticas" de educação física, de arte, sociologia e filosofia.

O estudante depois poderá optar por seguir uma das quatro áreas do conhecimento: linguagens e suas tecnologias, matemática e suas tecnologias, ciências da natureza e suas tecnologia, ciências humanas e sociais aplicadas e formação técnica e profissional. As escolas, porém, não serão obrigadas a oferecer todas essas opções. Os ensinos de matemática e português serão obrigatórios nos três anos.

A carga horária de ensino subirá de 800 horas anuais para 1.000 horas, pelos menos nos primeiros cinco anos; e depois será acrescida de forma progressiva para 1.400 horas ao ano.

Na cerimônia no Palácio do Planalto, o presidente Michel Temer ressaltou a "ousadia" do governo federal em propor reformas estruturantes, como a do próprio ensino médio e o teto de gastos públicos. E classificou a educação como "força motriz" para o crescimento e desenvolvimento do País e disse que o conteúdo da reforma ajuda a colocar o Brasil no rumo necessário.

Inconstitucionalidade

A MP da reforma do ensino médio enfrenta duas Adins (Ação Direta de Inconstitucionalidade) no Supremo do Tribunal Federal (STF). Em dezembro passado, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, encaminhou parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF) afirmando que a medida provisória é inconstitucional.

O subsecretário da Educação do Estado da Bahia, Nildo Pitombo, também apontou dificuldade financeira na implementação do novo modelo no estado baiano. Para ele, a reforma é seletiva, porque, conforme disse, a Portaria n º 1.145, do MEC, sinaliza que o ensino médio noturno e o projeto de Educação de Jovens e Adultos (EJA) não terão os mesmos enfoques previstos para o período diurno.

Pitombo avaliou ainda que a iniciativa "tem gosto de café requentado" por ter o foco voltado para o mercado de trabalho. O alvo para o qual o novo modelo aponta, analisa, retrocede à década de 1940, sobretudo no que se refere à "dualidade" do sistema educacional.

"Na década de 1940 havia uma escola que preparava para a ação propedêutica; e de uma forma dual convivíamos com outras que preparavam para o trabalho nos ramos do comércio, da indústria e agricultura. Esse modelo dual não servia à nação. Isso mudou a partir de 1960 quando tivemos declaradamente do ponto de vista institucional formal a escola única", discorreu Pitombo, fazendo memórias ao cientista baiano Anísio Teixeira (julho de 1900 a março de 1971), defensor do modelo único da educação básica e o principal idealizador das grandes mudanças que marcaram a educação brasileira no Século 20.

Pitombo estendeu ainda as críticas ao modelo do ensino integral que, em sua análise, deve reduzir o tempo do aluno para obter os conhecimentos nos quais os instigam "ao questionamento, à investigação e à dúvida", por não incluir, por exemplo, Filosofia e Sociologia como disciplinas obrigatórias, que agora tornam-se componentes dentro do conjunto que a Base considerará fundamental.

O ministro da Educação, Mendonça Filho, acredita que o novo modelo de ensino médio deve começar a ser implementado em 2019. A estimativa inicial, porém, era de que as primeiras turmas fossem criadas em 2018. "Só em 2019 teremos a preparação necessária para que as propostas sejam implementadas com mais profundidade", estimou.


Fonte: Viviane Monteiro – Jornal da Ciência








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