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12/04/2018



Desenvolver novos medicamentos exige ampliar colaborações


 
 Jordi Quintana, responsável pela plataforma de descoberta de novos medicamentos no Parque Científico de Barcelona, afirma em Escola SP que é preciso unir forças entre o que há de melhor na academia e na indústria (foto: Daniel Antônio / Agência FAPESP)

Existe uma lacuna entre a academia e a indústria farmacêutica na descoberta e no desenvolvimento de novas drogas e a colaboração contínua entre as duas áreas garantiria maior eficiência. É o que defende o pesquisador espanhol Jordi Quintana, professor da Universidade Pompeu Fabra, e por 10 anos diretor responsável da plataforma de descoberta de novas drogas e diretor científico de desenvolvimento de negócios no Parque Científico de Barcelona, na Espanha – conglomerado de três centros de pesquisa públicos com cerca de 100 empresas e startups.

Em visita ao Brasil para participar da São Paulo School of Advanced Science on Medicines: from Target to Market, realizada na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) com apoio da FAPESP, Quintana deu palestras sobre colaboração entre os dois setores e a necessidade de integração entre as diversas áreas em pesquisa.

“No meu caso, mover da indústria para a academia foi uma oportunidade de desenvolver algo completamente novo na Espanha, combinando química, medicina e biologia e fazendo pesquisas e projetos interessantes”, disse.

Quintana começou a carreira na indústria farmacêutica e também foi um dos líderes no Consórcio Internacional de Pesquisas sobre Doenças Raras (IRDiRC). Embora se diga afortunado por ter tido esta experiência, algo que ocorreu de certa forma por acaso, Quintana é um defensor da colaboração entre indústria e academia. “É a maneira mais eficiente de se desenvolver novos fármacos”, disse.

Leia a seguir a entrevista de Quintana à Agência FAPESP:

Agência FAPESP – Por que ainda é tão difícil descobrir e desenvolver novos medicamentos? 
Jordi Quintana – São necessários três elementos para descobrir uma nova droga: muitas pessoas com conhecimento em diversas áreas – como biologia, química, pesquisa clínica – trabalhando juntas, financiamento para toda a operação e conhecimento sobre a doença. Esses três componentes são difíceis isoladamente e ainda mais quando combinados.

Agência FAPESP – Em uma de suas palestras na Escola São Paulo de Ciência Avançada em Medicamentos, o senhor falou sobre a necessidade de colaboração. Por que a falta de colaboração seria um fator importante na redução da eficiência?
Quintana – A colaboração entre academia e indústria é importante por causa da complexidade das doenças e de todo o processo que envolve a descoberta e o desenvolvimento de novas drogas. Para que uma droga seja descoberta é preciso cobrir diferentes áreas. Basicamente, envolve obter um composto ou produtos que tratem ou curem uma doença. Mas também é muito complexo entender os mecanismos de uma doença e as estratégias para cessar o avanço de uma doença. Para atingir essa complexidade, é mais eficiente reunir o conhecimento e as experiências prévias da academia ou da indústria com um objetivo comum, que é curar uma doença específica. Outro ponto importante é que o cientista precisa estar aberto a áreas complementares a sua pesquisa. Se está focado em química, por exemplo, é bom que saiba o que os biólogos estão fazendo, ou o pessoal de farmacocinética, ou que lida com a estrutura biológica. É preciso ter curiosidade e interesse de saber como eles conseguiram obter determinados resultados ou de que resultados precisam. Acho que na indústria isso é feito de forma natural, porque um objetivo alcançado em uma doença, por exemplo, é importante para toda a empresa. A maneira como eles conseguem essa integração está na maneira como constroem o projeto. Um desafio da academia está em construir projetos, trabalhar e detectar questões ao longo do processo ao lado de outros especialistas.

Agência FAPESP –Tem havido grandes esforços em inovação na área de Ciências da Vida, mas tendendo para estratégias de saúde digital (digital health) e de prevenção e não tanto para a produção de novos medicamentos. Qual a sua opinião sobre isso?
Quintana – As áreas de digital health e e-health estão crescendo. É a combinação, outra vez a integração, de duas áreas: tecnologia da informação e saúde. Toda vez que há convergência de duas áreas distintas há inovação. Na área de Saúde, é possível prever a necessidade de drogas. É o que fazem os sistemas de e-health ou digital health, que, por exemplo, podem controlar a pressão arterial de uma pessoa. Dessa forma, não se precisará de determinada droga para a pressão arterial por já ter tomado ações preventivas antes de precisar do medicamento. Por outro lado, o desenvolvimento de novas drogas sempre vai existir. Sempre teremos essa necessidade, inclusive a questão é que precisamos torná-la mais eficiente, pois ainda existem muitas doenças sem um único tratamento medicamentoso.

Agência FAPESP – Em termos de inovação, como a tecnologia da informação e a bioinformática podem auxiliar a descoberta de novas drogas?
Quintana – A inovação está crescendo por causa do crescimento de dados associados ao número de pesquisas. Bioinformática e computer drug design [planejamento de fármacos auxiliados por computador] são tecnologias relativamente novas, cuja importância tem crescido a cada dia por duas razões. A primeira é que novas tecnologias e novas descobertas estão ocorrendo nesses novos campos. A segunda é que hoje há mais dados em diferentes laboratórios espalhados pelo mundo. Portanto, se pegarmos laboratórios acadêmicos e laboratórios industriais em vários países, com o uso de bioinformática e do conhecimento científico advindo do computer drug design será possível analisar e integrar esses dados.

Agência FAPESP – Ao longo de sua carreira, o senhor migrou da indústria para a área acadêmica. Trabalhou inclusive no Consórcio Internacional de Pesquisa em Doenças Raras, que combinava especialistas da academia e da indústria. O que o fez mudar de setor tantas vezes?
Quintana – Para mim, foi uma grande oportunidade estar envolvido nesses dois diferentes ambientes, fazendo pesquisas e projetos interessantes. No meu caso, mover da indústria para a academia foi uma oportunidade de desenvolver algo completamente novo na Espanha, combinando química, medicina e biologia. Isso não era possível de ser feito na indústria. Depois, também fui afortunado de poder trabalhar tanto na indústria como na academia no desenvolvimento de novas drogas.

Agência FAPESP – O senhor aconselha os cientistas mais jovens a fazerem o mesmo?
Quintana – Sim. Há incertezas em muitas coisas da vida. No caso de jovens pesquisadores e pós-doutorandos, a escolha entre seguir a vida acadêmica ou ingressar na indústria não é tão importante assim. O que importa é estar aberto a novas possibilidades e estar interessado em um desafio em particular, independentemente de ser na indústria ou na academia. Esses desafios podem até mudar ao longo da vida e é preciso estar aberto para oportunidades vindas da área acadêmica ou da indústria. O fato é que a indústria está cada vez mais trabalhando com a academia e a razão disso é a complexidade de descobrir e desenvolver novas drogas. É fundamental integrar pessoas que têm mais conhecimento na primeira parte do processo [ciência básica] com outras que dominam a segunda parte [aplicação], onde a indústria tem mais tradição. 


Fonte: Agência FAPESP








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