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A Reação de Substituição Eletrofílica Aromática e Equívocos em Alguns Livros Texto de Química Orgânica no Ensino dos Grupos Flúor e NitrosoTítulo
Livros didáticos destinados cumprem um papel importantíssimo como instrumento auxiliar no ensino e no aprendizado da ciência, mas não são infalíveis. Quando uma imprecisão é detectada, cabe ao leitor (e ao Professor em particular), contribuir para que a imprecisão não se propague e o tema não seja ensinado de forma errada. Afinal, o Professor adota o livro didático, mas não é por ele adotado.
Neste sentido, o artigo "A REAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO ELETROFÍLICA AROMÁTICA E OS EFEITOS DOS GRUPOS NITROSO E FLÚOR: CORREÇÃO DE IMPRECISÕES EM LIVROS TEXTO", publicado em Química Nova (Vol. 48, No. 6, e-20250188, 2025) no número especial dedicado ao Professor Raimundo Braz Filho, na área de Educação, contribui para sanar imprecisões no ensino fundamental de Química Orgânica.
A ideia deste trabalho surgiu após dois dos autores realizarem o Exame Unificado de Química (EUQ-2024.1) e se depararem com uma questão envolvendo a química do grupo nitroso, em específico o fenilnitroso (simplificadamente escrito aqui como Ph-N=O) em reação de Substituição Eletrofílica Aromática (SEAr), até então uma novidade em suas trajetórias acadêmicas, pois anterior a este momento não conheciam este grupo funcional.
A questão em si apresentava um gabarito que parecia contrariar as teorias estruturais amplamente ensinadas em química orgânica, e isto foi motivo para atiçar a curiosidade cientifica e levantar um debate dentro do nosso grupo de pesquisa, com diversas reuniões informais para discutir a questão, se seu gabarito estava correto, e os motivos para isto. A conclusão, após consultar profundamente a literatura científica de química orgânica, que apresenta dados experimentais irrefutáveis, foi de que, além do gabarito apresentado para a questão do EUQ estar incorreto, uma parte dos livros textos, quando explicam esse grupo, também apresentavam esta informação incorretamente.
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Os autores do artigo (da esquerda para a direita): Igor Sande, Leonardo Antonelli, Matheus Almeida Ramos de Jesus e Silvio Cunha, que atuam no Instituto de Química da Universidade Federal da Bahia.
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Em pouco tempo, as reuniões no grupo de pesquisa se intensificaram e foi posto em pauta outro grupo funcional que apresenta informações imprecisas em livros textos, o átomo de flúor, cuja reatividade e seu efeito da SEAr é diferente dos demais halogênios. Assim, a equipe, com a curiosidade de entender os efeitos estruturais e de reatividade dos grupos nitroso e do flúor, coletou uma grande quantidade de artigos científicos e livros de graduação e pós-graduação e teve a ideia de esclarecer as imprecisões, produzir um material didático e transformá-lo em um artigo.
No trabalho publicado, a equipe mostra que os livros texto apresentam o grupo nitroso em SEAr como desativante do anel aromático e diretor para as posições orto e para, como os halogênios cloro, bromo e iodo. Porém, o que é observado experimentalmente é que duas moléculas contendo o grupo nitroso reagem para dar origem a um dímero, e é esse dímero que efetivamente reage e é responsável pela seletividade da reação para as posições orto e para, dissociando ao fim da reação e fazendo parecer que o nitroso é que apresenta esta seletividade, mesmo sem razões estruturais e eletrônicas para isto.
Em paralelo, o grupo flúor é tratado como similar aos demais halogênios em SEAr nos livros texto, desativando o anel aromático, mas direcionando para as posições orto e para. Esta informação está contida em grande parte dos livros didáticos, mas, novamente, dados experimentais disponíveis na literatura primária mostram que ele é ativante na posição para e desativante nas posições orto e meta, sendo este comportamento causado por um balanço entre o efeito indutivo retirador do átomo de flúor e seu efeito doador por ressonância, que variam de forma distinta no anel aromático: o indutivo decai através das ligações sigma e o de ressonância afeta apenas átomos alternados.
Após a coleta, apresentação e análise dos dados imprecisos em todas as fontes, o artigo emprega os dados reais da literatura primária e explica como funciona a reatividade em SEAr desses dois grupos funcionais, e se espera que em edições mais novas dos livros texto estes dados estejam corrigidos, não havendo o ensino incorreto dos efeitos desses dois grupos funcionais na reatividade da SEAr. Agora os Professores de Química Orgânica, que desejarem ensinar o comportamento desses dois grupos em suas aulas, dispõem de um material didático atualizado.
O artigo está disponível em: http://dx.doi.org/10.21577/0100-4042.20250188
Fonte: Silvio D. Cunha (UFBA) , Conselho Consultivo da SBQ
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