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19/11/2020



Me dê motivos (pra ir embora)


Brasil trata mal seus pós-doutores ao não oferecer direitos trabalhistas. Diferenças com EUA e países da Europa é gritante maior

As condições de trabalho para o pesquisador em pós-doutoramento são muito diferentes no Brasil em comparação aos países que investem estrategicamente em pesquisa e desenvolvimento. Nesta quarta matéria da série "O Pós-Doutoramento no Brasil", iniciativa do comitê Jovens Pesquisadores SBQ, três cientistas brasileiros empregados em instituições públicas e privadas nos Estados Unidos, Reino Unido e Espanha, demonstram essas diferenças que vão desde a representação sindical a licenças maternidades compartilháveis.

"No Brasil, as bolsas de pós-doutoramento não geram vínculo empregatício, então temos relações de trabalho extremamente precárias", avalia o pesquisador Alan Cesar Pilon (FCFRP-USP), membro ativo do JP-SBQ. "Não temos os mais básicos direitos trabalhistas como o seguro saúde ou férias remuneradas, apenas para citar dois exemplos."

Denise, Gabriel e Thaís: três pesquisadores brasileiros que conseguiram boas posições em universidades e empresas na Europa e nos EUA. "Sem perspectivas de volta no curto prazo."

Pilon destaca o problema do tempo de formação do cientista em relação à aposentadoria. Enquanto para a grande maioria das categorias profissionais, a pessoa entra no mercado de trabalho logo que termina a graduação, o cientista ainda tem o tempo do mestrado, do doutorado e do pós-doutoramento antes de um emprego formal. "Isso gera situações absurdas. A pessoa começar a contribuir para a aposentadoria em torno dos 35 anos de idade. Assim, vamos nos aposentar quando?", questiona.

Para além da aposentadoria, a tabela abaixo mostra o quanto as diferenças são gritantes. No Brasil, o que é chamado de 'bolsa', mas que na verdade é o salário de pesquisador altamente qualificado, tem um valor aproximado de 790 dólares (CAPES) e 762 (CNPq) – a FAPESP é uma exceção no País, e chega a pagar 1.300 mensais em seus projetos. Na Espanha, salário médio de um pesquisador (pós-doutor) é de 1.750 dólares. No Reino Unido, este valor é de 3.700 dólares e nos EUA, em torno de 3.300. As bolsas da Fundação Marie Curie têm o maior valor na Europa, equivalente a 6.400 dólares.

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A licença maternidade é outra diferença que chama atenção. No Brasil, pesquisadoras da CAPES e do CNPq têm direito a quatro meses de licença. Na Espanha, as mães têm direito ao mesmo tempo, mas os pais também têm direito a dois meses. No Reino Unido, as mães têm direito a 52 semanas, e existe uma modalidade que permite que pai e mãe compartilhem esse tempo juntos em licença, um avanço que leva em conta a adoção por casais de diferentes orientações sexuais.

"Aqui no Reino Unido, nós cientistas somos vistos com bastante respeito pela sociedade", conta a pesquisadora Thais Tasso Guaraldo, pós-doutoranda no Departamento de Engenharia Química da Universidade de Bath, onde trabalha no desenvolvimento de materiais para o tratamento de água. "O pós-doutoramento é um emprego (muito bem qualificado, aliás) regulamentado, com direitos e deveres e sujeito à representação sindical", descreve.

Depois de obter seu doutorado em 2014 (Química analítica, pela UNESP), Thais fez um pós-doc no IQSC-USP, e depois um segundo pós-doc sanduíche na Universidade de Nottingham na área de eletrodeposição de metais usando líquidos iônicos. "Agora sou pesquisadora associada no departamento de Engenharia Química. Fui contratada por dois anos, para um projeto previsto para cinco. Depois de dois anos já estendi por mais um ano. O pesquisador chefe é o responsável pelas relações de trabalho com as agências de fomento e as contratações de pesquisadores e doutorandos."

O caso de Denise Medeiros Selegato é parecido. Ela concluiu seu doutorado pela UNESP e partiu para o exterior. Fez um pós-doutoramento no CERM (Centro de Ressonância Magnética) da Universidade de Florença e este ano foi contratada pela Fundação Medina, na Espanha, onde trabalha com a metabolômica de micro-organismos para desenvolvimento de novos agentes farmacêuticos. Tanto em sua experiência na universidade italiana quanto na iniciativa privada espanhola, as condições de trabalho são bem superiores às do Brasil. "Na Itália, mesmo com contrato de um ano não-renovável, eu era funcionária da universidade. Aqui, tenho um contrato de três anos com todos os direitos trabalhistas e representação sindical", conta a pesquisadora.

Gabriel Mazzi Leme chegou a Minnesotta (EUA) em 2018, para trabalhar como pós-doutorando no Departamento de Química da Gustavus Adolphus College, desenvolvendo e aplicando métodos de separação bidimensionais em compostos biofarmacêuticos e derivados. Ao final de seu contrato, conseguiu um emprego na iniciativa privada, no departamento de Desenvolvimento de Processos da Amgen, na California.

"Aqui um pesquisador (pós-doutor) tem os mesmos direitos que os funcionários das universidades: dedução do salário para aposentadoria e plano de saúde, representação sindical, tudo...", assinala. "Mas eu estou aqui com visto de trabalho então tenho restrições: por exemplo, não posso pleitear uma bolsa para um projeto de pesquisa – eu tenho que ser contratado por algum pesquisador-chefe."

Nos EUA, é comum que o primeiro contrato com um pesquisador seja feito com duração de oito meses e depois renovado. "É uma espécie de período de testes, em que o pesquisador não fica sem seus direitos, mas pode ser demitido ao final se não corresponder às expectativas do chefe", explica Gabriel.

Os três pesquisadores ouvidos nesta matéria admitem que não consideram voltar para o Brasil no curto prazo. "A pesquisa no Brasil hoje está bem comprometida. Se houvesse mais oportunidades, eu pensaria em voltar, trabalhar perto da família", afirma Thaís. Denise concorda: "Minha primeira opção seria ficar no Brasil, mas no curto prazo é impossível pensar em voltar." Na opinião de Gabriel, "ninguém gosta de ficar longe de casa, da cultura, dos amigos e família... mas se é aqui que eu consegui um bom emprego para fazer o que sei, e aqui que vou ficando".

O comitê JP SBQ convida todos os pós-doutorandos e jovens doutores a participarem das atividades pelo fortalecimento do ecossistema de pesquisa científica no Brasil.

Na próxima matéria desta série, falaremos mais sobre a qualidade da pesquisa e dos pesquisadores brasileiros e a fuga de cérebros.

Ouça a íntegra desta entrevista: https://anchor.fm/sbqast/episodes/JP-SBQ-Especial-4---Condies-de-trabalho-do-pesquisador-eml75j

Leia a série sobre o Pós-Doutoramento no Brasil
Matéria 1: http://boletim.sbq.org.br/noticias/2020/n3539.php
Matéria 2: http://boletim.sbq.org.br/noticias/2020/n3543.php
Matéria 3: http://boletim.sbq.org.br/noticias/2020/n3552.php



Texto: Mario Henrique Viana (Assessoria de Imprensa da SBQ)








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